O protagonismo da geração distribuída no mercado solar brasileiro

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O Brasil entrou na lista dos 15 maiores países em capacidade de geração fotovoltaica recentemente, após ultrapassar os 10 GW de capacidade instalada, atraindo R$ 52,7 bilhões de investimentos. Foi da geração distribuída a principal contribuição para esse marco, com mais de 6 GW instalados em usinas de até 5 MW cada e R$ 33 bilhões em investimentos. E tudo indica que os próximos 10 GW também virão principalmente dessa modalidade de geração própria. 

A Empresa de Pesquisa Energética simulou cinco cenários para a expansão da micro e minigeração distribuída, que indicam uma capacidade instalada entre 23 e 42 GW em 2031. No cenário de referência, a EPE projeta 26 GW instalados em 2031, que irão atender mais de 3 milhões de unidades consumidoras. Ou seja, o cenário considerado mais provável é que a GD adicione mais aproximadamente 20 GW de capacidade em dez anos. 

Em contraste, a EPE projeta que a geração centralizada, com usinas acima de 5 MW fora do sistema de compensação de energia, acumule apenas 8,4 GW de capacidade até 2030. A empresa ainda não atualizou os estudos e projeções para a geração centralizada para o ciclo até 2031. Atualmente, são 3,8 GW de capacidade solar em usinas centralizadas. Isso significaria uma expansão de apenas pouco mais de 4 GW até 2030, pelo cenário de referência da EPE. 

Entretanto, como a própria empresa de pesquisa aponta, a expansão indicada nos estudos do Plano Decenal de Expansão da Energia consideram o atendimento às necessidades do sistema, tanto de potência quanto de energia. Mas o governo só pode controlar de fato o mix de energia contratado em leilões para atender o mercado regulado. No mercado livre, que tende a ser ampliado nos próximos anos com a gradual abertura para adesão de novos consumidores de menor porte, há incentivos para a aquisição de energia renovável e não há como o governo determinar a divisão do atendimento à demanda. 

De acordo com a Aneel, há 24,7 GW de usinas solares centralizadas em implantação no Brasil, com cronograma de entrada em operação até 2026. Desse total fiscalizado pela agência reguladora, 23,3 GW estão fora do mercado regulado. Ou seja, são usinas que não foram contratadas em leilão mas que já estão em implantação – ainda que a maior parte, 20,9 GW, não tenha iniciado a construção – muito provavelmente voltadas para o mercado livre. 

Marco regulatório em 2021

A regulação atualmente bastante vantajosa, a queda de custos dos projetos – que pressiona a margem dos integradores -, e o retorno de investimento em cinco anos, em média, são alguns dos fatores que levaram ao crescimento acelerado da geração distribuída nos últimos anos. 

“Foram 4 GW só em 2020 e 2021, de investimentos realizados pela sociedade. Não conheço outra solução mais rápida que seja também sustentável”, diz o presidente executivo da Absolar, Rodrigo Sauaia. 

Com a recente aprovação na Câmara dos Deputados do Projeto de Lei 5.829/19, que cria o Marco Regulatório da geração distribuída, a matéria foi enviada para o Senado e a expectativa é que a lei seja promulgada ainda em 2021, dando mais previsibilidade e segurança juídica para o setor. O projeto começou a ser discutido ainda em 2019 e após muitas negociações, chegou à redação atual com consenso geral – a aprovação foi praticamente unânime, tendo 476 votos favoráveis e três contra. “Houve muita negociação, muito diálogo, todos tivemos que ceder um pouco. Mas com isso chegamos a um texto de consenso”, diz Sauaia.

Um dos cenários da expansão da micro e da minigeração estudados pela EPE, o chamado “Fio B Gradual”, foi inspirado nas alterações do sistema de compensação de energia trazidas pelo projeto de lei. Nessa projeção a geração distribuída chegaria a 36 GW de capacidade em 2031 – sendo mais de 90% da fonte solar. Esse cenário, entretanto, tem algumas diferenças em relação ao texto que foi aprovado na Câmara.

Pelo PL 5.829, os sistemas de geração distribuída já instalados ou aqueles que tiverem parecer de acesso liberado em até 12 meses após a promulgação da lei, permanecem sob as regras atuais até 31 de dezembro de 2045. Ou seja, seguirão descontando os créditos de energia dos seus sistemas sobre todas as parcelas que compõem a tarifa de energia. 

Já para os novos consumidores com geração distribuída, a parcela da tarifa que remunera as distribuidoras começará a ser paga (não poderá ser compensada com créditos) gradualmente, até sua totalidade, em 2029. A chamada parcela B, que remunera os serviços e os ativos das distribuidoras, corresponde a aproximadamente 17% da tarifa de energia. Os consumidores com geração distribuída devem passar a pagar 15% dessa parcela a partir de 2023; 30% a partir de 2024; 45% a partir de 2025; 60% a partir de 2026; 75% a partir de 2027; e 90% a partir de 2028.

Em sua projeção, a EPE considerou que o pagamento da parcela B começaria em 20% a partir de 2023 e chegaria a 100% a partir de 2031.

Contratação de geração distribuída até 30 MW

O que também pode impulsionar a geração distribuída, de “grande porte” mas ainda detida pelo próprio consumidor, é a possibilidade de contratação por parte das distribuidoras. No final de agosto, a Aneel encerrou uma consulta pública sobre o modelo de contrato para que as distribuidoras de energia contratem serviços ancilares de usinas de geração distribuída com até 30 MW. 

Em tese, as distribuidoras podem contratar energia da geração distribuída desde 2015. Mas apenas em 2018 foram definidos os critérios de precificação específicos para cada fonte – antes, a referência era o preço de grandes usinas hidrelétricas, inviável para remunerar projetos de pequeno porte. 

Restava ainda definição do modelo contratual, que deve ser anunciada pela Aneel com base nas contribuições recebidas durante a audiência pública. “Agora o jogo começou a acontecer”, diz Rodrigo Sauaia.

A Copel, distribuidora do Paraná, já teve autorização para um projeto piloto em que pode contratar geração distribuída para testar o funcionamento de microrredes. Com a publicação do modelo contratual de referência, mais distribuidoras poderão se juntar a ela e publicar seus próprios editais. “Não é uma compra obrigatória, mas sabemos que distribuidoras da região Sul e Sudeste estão olhando com atenção para isso”, diz Sauaia. A contratação pode ser vantajosa e uma alternativa à expansão da rede.

“Além disso, como a GD fica na área de atuação da distribuidora, os ganhos dos projetos, como empregos e investimentos, ficam localizados naquelas áreas. Para as distribuidoras que ainda são controladas pelos governos estaduais, pode fazer sentido como política pública”, comenta Sauia.