Política industrial promete expansão da fabricação solar no Brasil

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O mercado fotovoltaico brasileiro está quente. Este agosto, o país ultrapassou 17 GW de capacidade total instalada. Deve chegar a 25 GW até ao final do ano, de acordo com números da ABSolar.

Desde 2017, a fabricação solar no Brasil tem vindo a abrandar significativamente. De acordo com o Ministério do Comércio Exterior e Serviços, em 2021 o Brasil gastou US$ 2,3 bilhões em células solares “montadas em módulos ou painéis”, ou seja, equipamento pronto para instalação. O valor para células “não montadas”, ou insumos para fábricas locais, foi quase noventa e nove vezes menor, a US$ 23,3 milhões. Isso significa que no ano passado, apenas 1% de todas as células solares que entraram no Brasil foram insumos para a fabricação local. Em 2017, esse número era pouco mais de 30%.

Alterações fiscais

A fabricação brasileira sofreu seu maior golpe em 2019, quando produtos importados ficaram isentos de 12% de imposto de importação. No entanto, com a inclusão de insumos para a fabricação de FV no Programa de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico da Indústria de Semicondutores, PADIS, em janeiro deste ano, os fabricantes brasileiros podem agora reclamar crédito sobre o seu investimento em pesquisa, desenvolvimento e inovação no Brasil. Além disso, com a caída do veto do Presidente Jair Bolsonaro sobre a lei 14.300 este julho, os projetos de geração distribuída podem agora ser inseridos no Regime Especial de Incentivos para o Desenvolvimento da Infraestrutura, REIDI, ficando isentos das contribuições PIS/COFINS.

Estado da fabricação

Opiniões divergem sobre se esses incentivos fiscais mudarão o cenário sombrio da fabricação brasileira dos últimos cinco anos.

Para Adalberto Maluf, diretor de sustentabilidade, marketing e novos negócios da BYD Brasil, a manufatura local pode atingir 10% de participação de mercado já no final do ano, e 20% até 2023.

Em abril de 2022, o fabricante de módulos solares, de armazenamento e veículos elétricos (VE) acrescentou uma nova linha de produção à sua unidade de produção de módulos em Campinas, São Paulo, tornando-se o maior fabricante do Brasil. A BYD abriu sua fábrica pela primeira vez em 2017, com uma capacidade de 260 MW, que agora dobrou para 500 MW.

“Vimos um crescimento muito consistente no mercado de geração distribuída. A gente acredita muito em uma solução integrada de veículo elétrico com o sistema solar distribuído. A gente está abrindo 25 concessionários de carros, em todas as grandes cidades, e 45 até ao final do ano. Então a gente acredita muito que esses concessionários de carros também vão aprender a vender sistemas solares,” disse Maluf. “Também expandimos a fábrica porque a inclusão de insumos para a fabricação solar no PADIS aumentou a competitividade dos módulos locais. Mesmo pagando um pouco mais de imposto do que o importado, a gente consegue agora estando dentro do PADIS ter crédito sobre ele para repassar o crédito para o cliente, então a diferença tributária ficou menor. Se a geração distribuída entrar no REIDI, a distorção tributária vai acabar,” acrescentou.

Para Gustavo Vadja, chefe de desenvolvimento de negócios do Brasil na Canadian Solar, os módulos locais não têm chance de se tornar competitivos. Até recentemente, o fabricante de módulos FV era o maior fabricante do Brasil. Abriu uma fábrica com uma capacidade de produção anual de 380 MW perto de São Paulo em 2015, que desde então fechou suas portas no início de 2020, Vadja confirmou à pv magazine.

“Durante esse tempo, a fábrica fazia sentido, não pela competitividade, porque o módulo local nunca foi competitivo, mas porque naquela época o BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento] só financiava projetos utilizando módulos locais. Uma vez que os bancos de desenvolvimento abriram uma exceção para financiar menos os módulos e em vez financiar outros componentes, ter módulos nacionais não fazia mais sentido,” afirmou Vadja.

Ao contrário da BYD, a Canadian Solar não acredita que os incentivos PADIS mudarão a falta de competitividade dos módulos locais. “Não muda nada. A célula solar é responsável pela maior parte do custo do módulo. A escala de produção determina o preço, e as fábricas de grande escala estão na Ásia,” disse Vadja.

Política industrial  

Entre os entusiastas da fabricação brasileira, as esperanças estão altas para uma política industrial que proporcione escala, invista no desenvolvimento tecnológico e regionalize as cadeias de fornecimento do Brasil.

Falando em seu papel como presidente da associação brasileira de VE, Maluf relata uma receptividade positiva de seus encontros com os candidatos à presidência. “Se o presidente Lula ou o presidente Ciro vencerem, eles vão criar políticas públicas muito agressivas para a industrialização dos módulos. Se o governo Bolsonaro seguir em leja, ele já assumiu o compromisso de recriar o ministério da indústria, e com um mandato de fazer uma política industrial, que eles realmente não fizeram durante os últimos quatro anos,” disse Maluf.

A ABSolar também anunciou seu apoio à criação de uma política industrial que promova a isonomia tributária entre produtos nacionais e importados através de isenções fiscais para os primeiros.

Estas medidas poderiam preparar o cenário para a expansão da manufatura brasileira. Uma cadeia de fornecimento regionalizada, e pesquisa e desenvolvimento local serão necessárias para consolidar o cenário. De acordo com Wladimir Janousek, diretor da consultoria JCS e ex-gerente geral adjunto de operações de fabricação da Canadian Solar, “o Brasil não pode se chamar de fabricante se continuar a usar 99% dos insumos da China. Se o Brasil não desenvolver parte da cadeia de fornecimento no país, sua dependência continuará, o que foi agravado durante a pandemia.” Aponta a purificação do silício como um caminho promissor inicial, visto que o Brasil foi o terceiro maior produtor de silício do mundo em 2021. Janousek acredita que o país tem a capacidade técnica para produzir muitos componentes FV, mas falta escala.

A BYD está investindo em pesquisa e desenvolvimento no país, esperando regionalizar parte de sua fabricação de células. Está desenvolvendo células tandem de perovskita e silício em conjunto com o centro de tecnologia Renato Archer. A empresa espera ampliar e eventualmente abrir uma fábrica de células no Brasil. Fixando o objetivo em 1 GW, o dobro da sua atual capacidade de produção, a questão de quando “não depende da BYD, não depende do mercado, depende do governo: precisa criar uma política industrial,” argumentou Maluf.