Geradores solares têm prejuízos por restrições no sistema

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Os empreendedores de usinas solares estão dexando de gerar energia por causa do denominado “constrained-off”, isto é, restrições de operações determinadas pelo Operador Nacional do Sistema (ONS) elétrico, decorrentes de limitações ligadas ao sistema de transmissão. Só em 2020, 70 GWh (7,9 GW médios em um ano) deixaram de ser entregues por causa de restrições no sistema, de acordo com uma correspondência enviada pela Absolar para a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Em 2019, foram 33,5 GWh (3,8 GW médios em um ano), segundo levantamento da associação brasileira de energia solar.

Essas restrições reduzem a geração das usinas e, consequentemente, prejudicam o cumprimento das obrigações assumidas em contratos de compra e venda de energia, o que implica em prejuízos para os geradores. Pelo menos quatro agentes entraram com pedidos na Aneel de ressarcimento dos valores que precisaram pagar por não cumprir as obrigações contratuais: a Atlas Solar, a Enel, a Scatec e a Total Eren. 

A própria Absolar pediu que a agência regule o ressarcimento aos agentes quando restrições no sistema, alheias ao seu controle, os impedirem de gerar e cumprir com suas obrigações contratuais. O tema foi então incluído como prioritário na agenda regulatória 2021/2022 da Aneel. A previsão inicial era que uma audiência pública fosse aberta ainda no primeiro semestre, o que não ocorreu, para ser então discutida em reunião pública dos diretores no segundo semestre. 

Sem uma solução definitiva para a questão, a Scatec Solar, um dos agentes afetados, entrou com um pedido cautelar na agência, o que sugere urgência na avaliação do assunto. Com o pedido cautelar, a Aneel distribuiu em agosto o processo para a diretora Elisa Bastos, que deve analisar o caso da Scatec em particular. Em seu pedido de medida cautelar, a Scatec cita regulação da Aneel específica para o ressarcimento de eólicas por constrained-off. 

De fato, em resposta a um primeiro ofício enviado pela Absolar à agência, em abril de 2020, a Superintendência de Regulação dos Serviços de Geração afirmou que o resultado das discussões sobre constrained-off de usinas eólicas poderia ser aplicado também ao caso de restrições de operação de usinas fotovoltaicas. 

O exemplo eólico

Em março de 2021, os geradores eólicos conquistaram uma regulamentação da Aneel que prevê a possibilidade de ressarcimento dos prejuízos causados por constrained-off em casos específicos. A resolução normativa 927/21 foi resultado de uma consulta pública aberta em 2018 e pode ser base para uma regulação específica para o setor fotovoltaico. Ou ao menos dar pistas de como essas restrições podem vir a ser tratadas no caso das solares. 

A regulação estabelece por exemplo que os geradores serão ressarcidos pelo Encargo de Serviços do Sistema (componente da tarifa regulada de energia paga pelos consumidores cativos) somente se exceder 78 horas de restrições de indisponibilidade externa no ano. A regulamentação específica para eólicas também determina que o valor do ressarcimento será calculado considerando o Preço de Liquidação das Diferenças (PLD), o preço no mercado de curto prazo do ambiente de contratação livre.

A regulação, entretanto, abarca exclusivamente usinas eólicas contratadas em leilões para atender ao mercado regulado. 

Ou seja, as usinas que fecharam contratos com consumidores livres e deixam de cumprir obrigações de entrega de energia por restrições do sistema elétrico ainda não têm um tratamento legal para ressarcimento de prejuízos. Isto porque entendeu-se que a fonte de recursos para o ressarcimento, o ESS, não poderia bancar 

“Não sei como vai ser tratado o mercado livre, que ainda não tem tratamento no caso das eólicas. É preciso definir de onde vem o ressarcimento (para não caracterizar o subsídio cruzado do mercado regulado para o livre), mas é juridicamente muito plausível ter uma compensação também para esses agentes. O gerador assume uma outorga, mesmo sendo livre, tem os compromisso com a agência e o sistema mas também tem os seus direitos. Se está tendo restrição tem que ter um endereçamento desse ponto”, avalia André Edelstein, sócio do escritório especializado em energia Edelstein Advogados.