Entrevista com o presidente da ABSOLAR Rodrigo Sauaia: a fotovoltaica tem a mesma velocidade de implementação que a eólica

Share

pv magazine: o governo decidiu incluir a fonte solar fotovoltaica em apenas um dos leilões a serem realizados antes do final do ano. Como a ABSOLAR recebeu esta ação?

Rodrigo Sauaia: A ABSOLAR considera que não existe justificativa razoável para a exclusão discriminatória da fonte solar fotovoltaica do leilão A-6. Os argumentos dados pelo governo, de que a implementação da tecnologia é rápida e de que seria difíciles estimar corretamente os preços da energia em um horizonte mais longo, não possuem fundamento técnico ou econômico. A fonte solar fotovoltaica não somente tem a mesma velocidade de implementação que a fonte eólica, que foi incluída no leilão A-6, como também é frequentemente contratada para entrega em 5 anos, modelo aplicado em diversos países. Mesmo no Brasil, a fonte solar fotovoltaica já havia participado no passado de dois leilões A-5, ou seja, não há respaldo histórico para esta medida. Consideramos que a decisão foi um erro grave, que deve ser evitado no futuro. É preciso isonomia e justiça para o setor, incorporando-o em todos os leilões de energia elétrica do país, sem discriminações ou preconceitos subjetivos. Apesar disso, a inclusão da solar fotovoltaica no leilão A-4, a ser realizado em 18 de dezembro, é um sinal importante da retomada da contratação da fonte depois do cancelamento dos leilões de 2016. Adicionalmente, estamos remendando ao governo a realização um leilão adicional para solar fotovoltaica até o final do primeiro trimestre de 2018, com entrega da energia em meados de 2020, para recuperar a continuidade da contratação e um adequado desenvolvimento do setor solar fotovoltaico brasileiro.

Qual volume de projetos fotovoltaicos você espera que possa ser contratada no leilão A-4 deste ano?

Esta informação só será verificada de fato após a conclusão do leilão e dependerá da alocação realizada pelo governo. A recomendação setorial da ABSOLAR é de que o governo mantenha uma contratação anual na faixa 2.000 MW, volume este capaz de promover o adequado desenvolvimento dos diferentes elos da cadeia produtiva da fonte. Tivemos este nível de contratação em 2015, com dois leilões com participação da fonte.

Também, espera-se uma nova baixa dos preços de venda da energia?

Existem diferentes fatores a se ponderar nesta análise, alguns deles apontando para uma redução e outros para um aumento dos preços. Por um lado, os custos da energia solar fotovoltaica continuam uma trajetória de redução no médio e longo prazos. Embora seja possível um leve aumento a curto prazo, devido ao aumento da demanda sazonal de alguns países como EUA e China, a tendência de longo prazo prevalece. Estou otimista que a intensa competição prevista para o A-4, que contou com mais de 18,3 GW em projetos cadastrados, bem como a diversificação dos modelos de financiamento contribuirão para uma redução dos preços no leilão deste ano.

Você acredita que os projetos vencedores do leilão estarão melhor posicionados para a sua construção em relação aos anos anteriores?

O mapeamento de mercado da ABSOLAR indica que apenas alguns dos projetos do leilão de 2014 apresentaram desafios na sua entrega, devido a fortes turbulências da macroeconomia e política brasileiras no período. Para o A-4 deste ano, o prazo de quatro anos para a entrega é um prazo considerado confortável pelos empreendedores, o que traz mais segurança para a execução dos mesmos. Porém, para determinar se esses projetos estarão melhor posicionados em comparação com os dos leilões anteriores, devemos aguardar a definição do preço-teto e as condições contratuais, dois elementos fundamentais que ainda não estão finalizados.

Os estados brasileiros com a melhor infraestrutura de transmissão conseguirão mais contratos?

A energia solar fotovoltaica está atraindo muito interesse em todas as regiões do país, pois o recurso solar brasileiro é muito elevado e bem distribuído no território nacional. Existem projetos cadastrados para o próximo leilão nas regiões nordeste, sudeste, norte e centro-este do país. A região nordeste possui o melhor recurso solar, mas pode vir a competir na transmissão com projetos eólicos, por conta de restrições na capacidade de escoamento da região. Por outro lado, muitos projetos começam a ser cadastrados no sudeste e centro-oeste, onde existe margem de escoamento disponível. Com este fator, temos uma nova variável relevante para os empreendedores: além de um projeto com energia competitiva, ele precisarão avaliar a disponibilidade de transmissão para terem maiores chances no leilão.

Você acredita que, como está acontecendo em países como o Chile ou a Argentina, também no Brasil será possível fechar PPAs, entre agentes privados, no futuro próximo?

Dos pontos de vista regulatório e legal, não existe obstáculo para a realização de contratos da venda de energia entre agentes privados, exatamente como está acontecendo em outros países da América Latina. No Brasil, isso ocorreria no Ambiente de Contratação Livre (ACL). No entanto, há dois desafios para a contratação neste mercado: o primeiro é a competição direta da fonte solar fotovoltaica com projetos de outras fontes e de grande porte, como usinas hidrelétricas antigas e já amortizadas, que podem oferecer preços mais competitivos, por serem investimentos antigos e já neutralizados. Um segundo fator é a dificuldade de encontrar financiamento para esses PPAs, cujos prazos praticados no Brasil variam entre dois e cinco anos, ou seja, extremamente curtos para o ciclo de investimento de uma usina solar fotovoltaica. Por isso a relevância, nesta fase sa tecnologia no país, dos contratos de 20 anos oferecidos pelo governo nos leilões do Ambiente de Contratação Regulada (ACR). Quando a tecnologia solar fotovoltaica atingir um maior grau de maturidade no Brasil, uma maior contratação no ACL será natural, como começamos a observar agora no setor eólico nacional.