Altos Preços de energia, custos da fotovoltaica em queda e novas regras para GD por trás do carnaval solar do Brasil

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O fato do Brasil estar passando por um boom solar foi muito evidente na Intersolar South America, realizada em São Paulo na semana passada, como parte da feira da smarter E South America.

Segundo números divulgados pelo organizador do evento, Solar Promotion, a feira recebeu 341 expositores e cerca de 25.000 visitantes de 39 países. “Estamos impressionados com a excelente ressonância das nossas exposições e conferências”, disse o director da empresa, Florian Wessendorf. “A dinâmica da indústria e o enorme número de visitantes sublinham que o Brasil está pronto para o novo mundo da energia”.

A era da geração distribuída

Embora a energia solar em grande escala forneça o maior volume de crescimento da capacidade de geração no mercado brasileiro de energia fotovoltaica – graças aos leilões de energia renovável no país – a geração distribuída (DG) foi a protagonista pricipal na Intersolar. O segmento de pequena escala está experimentando seu primeiro rali de final de ano devido às mudanças legislativas propostas, que incluem uma redução tarifária no regime de net metering que pode ser introduzida no novo ano. Como resultado, a feira viu atividades ininterruptas de clientes potenciais em estandes continuamente lotados nos três dias do evento.

Marcelo Sousa, diretor de vendas, na América do Sul, para o  fabricante chines-canadense Canadian Solar, disse que as mudanças regulatórias pendentes podem afetar o mercado, mas apenas por um curto período de tempo.

“O mercado no Brasil está quase dobrando a cada ano e acredito que, independentemente das mudanças regulatórias, o mercado continuará crescendo à medida que se espera que os preços da energia continuem subindo”, disse ele. Sousa admitiu, no entanto, que o comportamento do mercado de DG – que inclui todos os sistemas com capacidade de geração abaixo de 5 MW – está mudando. Desde o ano passado, o setor fotovoltaico comercial e industrial reivindicou uma participação crescente no mercado de DG de energia solar, que era antes dominado pelo segmento residencial.

Qualquer que seja a dinâmica em jogo, a Canadian Solar está se beneficiando, de acordo com Sousa, com sua fábrica de módulos de 350 MW em São Paulo e um acumulado de pedidos no Brasil de 2 GW acumulado desde sua chegada em 2014. “A fatura desse marco será emitida esta tarde” Sousa disse à pv magazine no primeiro dia do show.

Ada Li, diretora na América Latina da fabricante chinesa de inversores Sungrow, compartilhou o entusiasmo. “A feira, que parece ter dobrado de tamanho em relação ao ano passado, está se expandindo e crescendo exatamente como o mercado, e nosso desempenho e receita no pais confirmam essa tendência”, disse ela. A Sungrow alega ter atingido 50% de participação no mercado da DG no primeiro semestre deste ano. “Acreditamos que após a emisão dos novos regulamentos, uma desaceleração do mercado poderá ser possível, mas continuamos muito positivos em uma perspectiva de longo prazo”, disse ela. “Este mercado precisa de energia solar, pois os consumidores de energia estão pagando preços muito altos”.

Thais Zampieri Bitancourt, gerente de mercado da fabricante austríaca de inversores Fronius, enfatizou como o nível profissional de expositores e participantes aumentou. “Participamos deste evento nos últimos sete anos e este ano parece mais profissional do que nunca”, disse ela. Bitancourt disse que o mercado solar brasileiro também continuará crescendo no próximo ano. “Aprendemos que a edição da Intersolar SA no próximo ano pode ser ainda melhor”, acrescentou.

Julian Rau, responsavel de vendas globais  na empresa suíça Stäubli, também ficou impressionado com a popularidade da feira. “Estamos planejando ter um estande maior para a edição de 2020”, disse ele. Rau disse, além disso, que o mercado brasileiro já está avançando sem fortes incentivos e, mesmo que sejam feitas alterações nas regras da DG, ele não se preocupará. “Existem tantos cidadãos particulares que desejam energia fotovoltaica, então estou convencido de que o futuro da geração distribuída não dependerá de decisões vindas do governo”, disse ele.

Novas tendências tecnológicas

Álvaro García Maltrás, director da América Latina e Caribe da fabricante chinesa de módulos Trina, disse que o suceso da feira é óbvio. “Estivemos nesta feira nos últimos quatro anos, mas este ano realmente cresceu em termos de espaço e visitantes”, disse ele. “Vimos muitas pessoas em todos os três dias do evento e também vimos que o nível profissional dela é maior.” Nos anos anteriores, as perguntas dos participantes não tinham conhecimento técnico e envolviam projetos de pequena escala, disse Maltrás, que acrescentou: “Agora estamos vendo volumes muito maiores e, é claro, suas preocupações técnicas também estão aumentando”.

Maltrás acredita que melhorias na tecnologia fotovoltaica e custos mais baixos, combinados com a alta radiação solar do Brasil, possibilitarão um maior crescimento nos próximos anos. Ele acrescentou que o Brasil é um dos últimos grandes mercados em que a tecnologia policristalina ainda não foi substituída por produtos mono. “Ainda estamos vendo muitos projetos contando com painéis multicristalinos nos segmentos de geração distribuída e em larga escala”, disse ele. “Em comparação com os EUA, Japão ou Europa, onde os módulos policristalinos simplesmente estão desaparecendo, o Brasil ainda mostra interesse por produtos policristalinos.” Isso pode mudar em breve, no entanto, com o representante da Trina acrescentando: “Na verdade, quase todos os módulos que estamos mostrando aqui em nosso estande são dispositivos monocristalinos”.

Novas oportunidades para o armazenamento

Apollo Chai, gerente de marketing internacional do fabricante chinês de inversores Goodwe, também observou a crescente sofisticação dos visitantes no estande de sua empresa. “Estamos aqui pela segunda vez e vemos muitos visitantes chegando”, disse ele. “Estou pessoalmente surpreso e chocado, pois vimos todos os clientes expertos, enquanto no ano passado ainda vimos pessoas nos perguntando o que é um inversor. Agora eles sabem o que estão procurando.”

Goodwe planeja um estande mais grande no próximo ano. Chai apontou que qualquer alteração na política da GD pode trazer uma oportunidade para armazenamento. “Ouvi dos clientes aqui que o preço da energia é quase tão alto quanto na Austrália, onde as pessoas estão comprando armazenamento mesmo sem incentivos”, acrescentou. A queda nos preços das baterias pode tornar o armazenamento uma opção viável no Brasil dentro de alguns anos, acrescentou.

As empresas brasileiras também são otimistas

Rodolfo Meyer, CEO da empresa Portal Solar, disse que o tamanho da feira reflete a escala do mercado brasileiro. “Eu sei que no próximo ano o tamanho da feira será dobrado”, disse ele, observando a importância do mercado de energia abraçar a energia solar. “Temos tarifas de energia extremamente altas e queda nos preços dos painéis”.

“Quanto às próximas mudanças regulatórias, a indicação que temos é de que deve haver tarifa da rede pelo custo das linhas de distribuição e que seria de cerca de 27%.” Essa porcentagem, ele acredita, será aplicada apenas no que for fornecido à rede elétrica e no Brasil, segundo dados do Meyer, cerca de 59% da energia solar gerada pelas instalações da DG é autoconsumo. “Mesmo supondo que você injete apenas 50% da energia gerada, a tarifa da rede se tornaria apenas 13,5%”, disse ele.

“O governo, no entanto, nos deu a garantia de que essa taxa não será retroativa e que o limite de 3,5 GW será mantido. Agora, temos cerca de 1 GW de capacidade instalada e sinto que, quando o governo confirmar o limite, teremos uma corrida do ouro e as pessoas continuarão a carreira a instalar painéis solares. ”

Além disso, Meyer acredita que a estimativa do governo de que o limite de 3,5 GW será atingido em 2022 está subestimando a taxa de instalações em alguns anos. “Até o final de 2020, no entanto, os custos do sistema fotovoltaico, módulo e BoS [balança de sistema] devem cair mais 5 a 10% e determinar outro impulso no mercado”, afirmou ele. “Isso também pode impulsionar a venda de baterias.”

Uma mudança gradual pode ser melhor

Segundo Marcio Takata, CEO da consultoria Greener, o segmento de geração distribuída continua sendo a melhor fonte de negócios no mercado solar brasileiro. “Esperamos que as novas mudanças nas regras de geração distribuída forneçam uma estrutura clara para o desenvolvimento do segmento”, afirmou. “O mercado depende de volumes de crescimento, uma cadeia de suprimentos eficiente e empreendedores bem preparados, e agora pode melhorar sua curva de aprendizado, que é fundamental para trazer os benefícios da tecnologia solar para os consumidores finais”, disse ele à pv magazine.

Emiliano Bellini da pv magazine, à esquerda, e Marcio Takata, CEO da consultoria brasileira Greener.

pv magazine

Sua consultoria fornece dados e relatórios de mercado para que os formuladores de políticas possam fazer as escolhas certas, disse Takata. “Espero que nosso regulador de energia, a ANEEL, introduza mudanças que sejam sustentáveis ​​e sem um forte impacto no desenvolvimento do setor”, disse ele. “Os benefícios para os consumidores que a energia solar está trazendo não podem ser ignorados.”

Takata disse que a demanda por energia deve aumentar nos próximos quatro a cinco anos. “As reformas tributárias e previdenciárias implementadas pelo atual governo podem ajudar a economia brasileira a se recuperar após vários anos de recessão”, acrescentou. “Isso pode desencadear demanda de energia e, como conseqüência, demanda por energia solar barata e fácil de implantar.”

Lucas Troia, diretor de desenvolvimento de negócios do maior instalador de sistemas fotovoltaicos do Brasil, Sices Solar, disse que o segmento DG está explodindo. “Sabemos que há uma corrida agora até o final de dezembro, mas também estamos muito otimistas de que a mudança regulatória não será tão abrupta”, disse ele. “Em nossa opinião, será uma transição suave e o mercado absorverá a mudança.” Com os preços da eletricidade subindo e os custos do sistema fotovoltaico diminuindo, o impacto da mudança regulatória nos tempos de retorno do sistema pode ser mínimo, de acordo com Troia. O próximo ano também será ótimo para a geração distribuída, ele previu, acrescentando: “O Brasil precisa de energia e a energia solar é a maneira mais barata e rápida de gerá-la”.

O anúncio de Bolsonaro

Como se a euforia de uma feira fervilhante não fosse suficiente, o  presidente brasileiro Jair Bolsonaro fez ontem sua segunda declaração oficial sobre energia solar.

Em um tweet publicado em sua conta pessoal, Bolsonaro disse que o governo está preparando projetos para reduzir as contas de energia do setor público.

Inevitavelmente, a lógica era inteiramente econômica, mas oferecia esperança, desde que a Amazônia continua a queimar.